sexta-feira, 23 de novembro de 2007

O SURF como meditação

Ao contrário do que a grande parte das pessoas pensam, meditar não implica necessariamente estar sentado ou deitado sem movimento físico. Na verdade podemos meditar a qualquer altura e instante, na caminhada, comendo, namorando, ou mesmo praticando algum esporte. O que é importante é que estejamos consciente daquilo que estamos a fazer, estarmos 100% concentrados e fundidos com a ação. Nestes momentos a mente encontra-se em repouso do constante frenesim caótico de pensamentos e por isso são momentos de profunda calma e relaxamento que nos trazem uma enorme satisfação. São momentos de consciência em que estamos totalmente conscientes do momento sem nos distrairmos num supérfluo enredo de pensamentos. Estes momentos proporcionam-nos paz, bem-estar, saúde, concentração, consciência, criatividade e crescimento pessoal. Meditar é viver o momento presente.

O SURF conecta-nos com o momento

Qual o surfista que ainda não se perguntou o que é que o liga tão intensamente ao surf? Que esporte, arte ou filosofia de vida é esta que faz com que cada vez que mergulhamos no oceano esqueçamos tudo, como uma purificação mental que a energia das ondas produz em nós? Uma ausência de tempo em que “limpamos” a mente e simplesmente vivemos o momento.Talvez porque num mundo de consumo rápido em que se vive a “tirania do tempo”, onde sempre se tem de ir a algum lado, o surf permita um simples momento de desprendimento e despreocupação em que apenas estamos focados e concentrados numa coisa: aquilo que estamos a fazer. Se estivermos tristes saímos da água alegres, se tensos ficamos relaxados, se preocupados esquecemos o problema. É como se uma sessão de surf nos conectasse com a natureza, com uma parte central de nós próprios. E no fundo a onda é uma forma de energia em movimento que o surfista conecta e flui.

O surf conecta-nos com o momento, o momento presente. Uma lucidez mental consciente e atenta, uma focada concentração requerida, e uma sincronia perfeita para simplesmente apanhar a onda, encontrar o seu ritmo. O surf alivia as tensões e ansiedades, alivia e cura as depressões e tristezas, traz consciência (atenção às circunstâncias, à realidade), felicidade, satisfação, bem-estar, alegria, paz de espírito, leveza física e mental e claridade.

Atualmente – sobretudo nos países desenvolvidos onde o surf tem mais tradição – desenvolve-se muito o lado competitivo e comercial do desporto, mas independentemente da forma como se encara ou do caminho que se escolhe, o surf é uma terapia. É como se na onda todos os elementos naturais e os sentidos humanos entrassem em harmonia numa ausência atemporal de personalidade, de um constante ego que se procura afirmar.

Um momento em que o ser se rende humildemente à mãe-natureza, ao momento que o rodeia. Uma comunhão e aceitação tão procurada e ambicionada na esfera da espiritualidade, um modo de estar familiar à meditação.O próprio acto de surfar condições extremas como quando o mar está gigante ou perto de bancadas rasas de corais exige um exímio grau de foco e concentração. Por vezes apenas escassos centímetros de água separam o surfista do afiado coral e uma queda pode inclusive ser fatal. Surfar uma onda como Teahupoo (Tahiti) ou Pipeline (Havaí), ou praticar tow-in em ondas gigantes, requer esse tipo de concentração em que se torna indispensável que o surfista “clarifique e limpe a mente” antes de entrar na água.

No fundo é um treino mental em que o surfista necessita de concentração, calma e claridade para enfrentar lucidamente as situações. É isto que permite o estado sublime de sermos UM com a onda, de sermos a própria onda - uma forma única e singular que se movimenta e propaga numa energia natural com o seu próprio ritmo e pulsação. Os americanos chamam a este estado - a diluição do ser na onda - “stoked”, os havaíanos “hopupu”, nós poderíamos dizer “êxtase”. Resume-se tudo ao momento presente. A uma fluida espontaneidade em que o ser/surfista se desprende e liberta dos seus medos e dança e flui com a onda numa comunhão do agora. Um momento em que o ser é fiel e autêntico a si próprio.

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